domingo, 2 de maio de 2010

Ensaio sobre a chuva

Foi uma chuva torrencial, seguida de trovões jamais vistos. Os raios iluminavam a sala frequentemente, induzindo a uma abertura maior de olhos e uma interjeição desaforada de susto. No início, acabrunhou aquela que só queria se mostrar, lavar o asfalto, deslizar no vidro do carro, penetrar no solo. A chuva que cancelou todos os planos, amaldiçando a tarde em vetores de velocidades d’água quase previsíveis: diagonal, vertical e horizontal. Um ritmo monótono que todos achavam sublime. Depois entendeu. Talvez a magnitude da chuva não só se encontrasse na simplicidade em como cai, mas também no seu som, aquele que sobre as telhas de alumínio se destaca como algo impenetrável, de ação e reação, dando pra ouvir até a criança que é o chuvisco. Nas cabeças não funciona muito diferente, uma espécie de pólo positivo, que é a chuva, atrai os pólos negativos que são as nossas cabeças; é uma boa explicação pra vontade súbita que temos de mergulhar na chuva: neutralizar nossas cargas, abluir nossos corpos.

Um espetáculo que não cansa de se mostrar, uma turnê democrática. Só conhece o reino puro, quem se torna fiel a esta beleza. Em um dia de dilúvio, cabeças neutralizadas, corpos em paz.

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