domingo, 22 de agosto de 2010

Cabeça de Oceano

Eu queria poder mergulhar minha cabeça no oceano e dominar as profundezas frias. Viro minhoca e sou arremessada como isca. Quero pegar um barco e velejar até que o som não possa me alcançar. Quero poder ser rainha da Nada, e reinar nas curvas e conjunturas do universo. Poder gritar e ser sentida por uma linha lateral a quilômetros de distância. Poder gostar de tudo por sentir saudade, poder admirar os humanos como deuses porque eles detêm de poderes sobre tudo.


Sou do oceano pacífico, do oceano sem estrelas.

Lúcia, moça de simplicidade

Quem diria que Lucia, moça de simplicidade, iria amá-lo com tanta vivacidade. Disseram-lhe que era pobre de causa vivida, pensou que seus joelhos eram fracos e que viveria arrastada em uma cadeira de rodas. Lucia, pobrezinha, tem choro mudo e riso apagado; quando nasceu pensaram que era muda, levou umas cinco palmadas pra fazer efeito, ao invés de chorar, soluçou. Seu pai lhe contou que até na barriga da mãe, ela tinha hora pra tudo, hora pra chutar, hora pra fazer doer, e nasceu exatamente no dia esperado. Lucia se tornou anormal por ser normal demais.

Na escola tivera poucos amigos; não quero me atentar a contar uma história comum de gente deprimida, disso já tem filmes aos montes. Lucia não tinha amigos porque não gostava do recreio, meninos correndo, empurrando as garotas, pegando seus lanches – que perca de tempo. Preferia pegar escondida a maçã da professora, comia a metade e o resto dava para um cachorro de três patas que sempre encontrava no caminho de volta pra casa. Mas na quinta série não há mais professora Rita, nem cachorro perneta; Lucia fez três amigos.

Seus três amigos eram os mais inteligentes da turma, ela não os acompanhava nas notas, não era o típico de garota reprimida e estudiosa, apenas era simples. Um deles virou seu namorado, três anos depois; o único namorado. Ele se apaixonou pelo seu olhar, pela tentação de saber o que se escondia atrás da blusa de gola alta, pela sua posição de sentar para conversar, de como enrolava seus fones, e por ela andar sempre com uma revista científica na bolsa a qual teria seu nome na Carta do Leitor da semana.

No segundo ano do ensino médio, tentaram fazer sexo. Ele por vontade, ela por amor. A segunda vez foi por vontade e amor. A terceira vez foi só vontade. A quarta foi depois de uma briga, ela o seduziu vestida somente com a blusa dos Rolling Stones; evitou o término do namoro.

Lúcia virou professora do primário, e agora recebe sua própria maçã.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

12 e 4

Tenha pena de Deus, roubei sua inocência. Tirei sua imagem de criador e coloquei o peso da culpa de todas as dúvidas e dívidas, de todas as preguiças e comodismo de se perguntar, de se limitar aos falsos parâmetros. Se só chegamos até aqui, é por culpa dele, e se chegamos até aqui é por culpa dele também.


Alguns dizem que seu amor é maravilhoso e que seu perdão é a libertação, e fizemos o mundo em reflexo da ignorância e egoísmo do homem. É repugnante pensar que pessoas estão em pé, ajoelhadas, sentadas implorando pelo perdão de Deus, prometendo sacrifícios, enquanto ainda se faz escolhas ordinárias.


Não quero me redimir a isto, não quero me tornar um corpo que peca e que vive em um mundo amaldiçoado, me limitando a apenas a pedir perdão. Perdão não move pedras, perdão não responde as ansiedades.


Todos os dias, deito minha cabeça ao travesseiro, sem a capacidade de adivinhar o próximo segundo. Alimento-me do amor que me lidera, um sentimento próprio, que o homem me fez sentir.


Enoja-me a capacidade de pessoas estarem sempre aptas a seguir caminhos que enaltecem ou subestima muito alguém. A vida é tão rápida e linda para que percamos tempo com escolhas que machuquem alguém; tão linda seria uma vida persuadida pelo amor. Tenho o amor como meu deus, como meus instintos básicos.


Tento não me calar pelo otimismo que se colide, ultimamente. Tento não me alienar aos magistérios da vida, tento encarar-la de modo seguro e ativo, com a bendita vontade de amar. Procurando por corações de ouro, procurando pelo universo onírico, procurando pelo Eldorado. Paradoxo seria se eu me desse conta que estou no Reino de Deus, 12 e 4 juntos.

sábado, 7 de agosto de 2010

Arnaldeando

"Papai falava pra mim: Arnaldo, você é parente de índio tabajara. E o vovô, que compôs essa música, né, era o pai dele, né, e era coronel e já foi eleito prefeito parece que duas vezes em Avaré, nem sei se tomou posse. Mas ele tinha um violão que era fabricado com canivete e fazia assobios e assobios pra passarinho caçar, era uma loucura, né. Mas ele ficava tocando essa música, né, e eu peguei e consegui acompanhar o dedo dele, né, porque eu sou canhoto mas só pra escrever, pra tocar violão eu não sou, que nem o Paul McCartney ou Jimi Hendrix, né. Então, eu dedilhava meio toscamente, meio aprendendo, né, mas ele me ensinou. Então, ele me ensinou, ele tinha catorze filhos, né, mas ele me ensinou, então eu fui e decorei e foi assim que ficou."


Não estou nem aí
Composição: Arnaldo Baptista

Vamos para longe
Vamos pra onde eu vou
Será que é difícil esquecer os males?
Let's to the sunshine
Vamos pra onde eu vou
Será que é difícil esquecer os males?

Ontem me disseram que um dia eu vou morrer
Mas até lá eu não vou me esconder
Porque eu não estou nem aí pra morte
Não estou nem aí pra sorte
Eu quero mais é decolar toda manhã

Quero decolar toda manhã
Quero decolar toda manhã

Num mundo de cristal
Num mundo surreal
A vida, a morte, o amor
A vida, a paz, o amor...






"Aquela foi uma época de testar minha resistência em tudo. Quando eu estava vivendo com a Martha, mãe do meu filho, cheguei a andar a pé até Catanduva, a 400km de São Paulo. Eu achava ela lindíssima, mas meio monótona. Então preferia andar, né? Eu não tinha mais instrumentos em casa, tinha vendido tudo e estava muito sem dinheiro. Ela falava que eu queria pertencer ao sistema, mas o sistema não queria que eu pertencesse a ele."



O que você acha do mundo hoje? 

Acho que a Terra está no apogeu da Era Ígnea. Pros ígneo-rantes, “ígneo” é relativo ao fogo, né? Em vez de usar o sol ou o vento pra produzir energia, ainda somos piromaníacos. Mas atingimos uma etapa em que devemos tomar consciência do que estamos fazendo com o nosso lar, a Terra. Poderíamos tentar nos comunicar com seres extra-terrenos pra ver se aprendemos alguma coisa. Mas se eu fosse um ET e visse a Terra como ela é hoje, tão careta e religiosa, hesitaria antes de entrar em contato com gente que poderia me julgar Deus. Imagina, eu fazendo telecinese por eletroímãs e o povo achando que era milagre? Penso também que a humanidade – mudando de palhaço pra físico, como eu te falei – aprendeu a eliminar os gauss (medida de densidade de fluxo magnético) dos ímãs, mas, pra vencer a força da gravidade, teria que eliminar os grávitons (partícula hipotética da gravidade quântica), que determina que objetos não-metálicos, como a minha mão, sejam impulsionados para baixo. Os discos voadores fazem isso. Mas o ser humano evolui, hoje em dia já se fabrica até aviões sem piloto, que atingem velocidades tão altas que uma pessoa não aguentaria. Vai saber até onde a humanidade chega... ciborgues, sei lá.





"Eu acho que Louvado Seja Deus é um lado que a gente tem um pendor pra fazer uma louvação a algo adorado, né. E com isso a gente aumenta o potencial dentro de cada um de nós, né, sem envolvimentos com vício e com coisas malignas, né. Então nesse sentido a gente vai levar a adiante isso de louvação onde o lado poético encontra amor até em entidades que são psicodélicas e atéias, como um deus que não tem nada a quem ele adore."

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Só há apenas uma resposta

- Eles não vão te responder.
- Como você sabe?
- Eu já tentei.
- Você é você, eu sou eu.
- E Eles continuam sendo eles.
- O que você quer dizer?
- Tente vencer por você mesmo. Eles não vão te ajudar.
- Não sei o que fazer.
- Sente e pense.
- Odeio quando você usa esse método socrático comigo. Se sabe a resposta, só me diz de uma vez. Eu só estou querendo mostrar que estamos nos tornando mais um personagem de Panis Et Circenses.
- Você precisa é amadurecer.
- Olha só quem fala... Você que...
- O quê? Vai falar o quê? Que eu não consegui nada na vida? É verdade, quem eu sou?  Quem eu sou pra te aconselhar? Some da minha frente.
- Eu não quis te ofender.
- Por favor...
- Eu vou atrás deles.
- Eu não ligo.




- Alô?
- Oi.
- É melhor você parar de ligar pra cá.
- Eu consegui.
- Conseguiu o quê?
- Você tinha razão, Eles não deixaram que eu entrasse na morada. Consegui entender sozinho porque as almas são tristes, porque os corpos sangram, tive que ser o Mito da Caverna, consegui ver o começo, o fim, o “a” e o “z” diante dos meus olhos, consegui ver a verdadeira cor, entendi porque lá não há pássaros e nem formigas, vi a 3º Guerra Mundial, vi as quatro forças, eu vi as sete cordas, depois eu...
- O quê?
- Eu tive que vir buscar você.
- Por que? Você não vê? Você conseguiu.
- Ainda não entendi o amor.